Episódio 5
A TEIA DA ARANHA DOURADA – Rodrigo Leste


No episódio 4, Alfredo, diretor do filme, e o professor Spencer, cientista político, tratam da história recente do País. Analisam a conjuntura, indo da CIA ao crime organizado, tentando rastrear os protagonistas da rapinagem ora em curso.

      Episódio 5



Marco e Geleia jogam sinuca no salão do Baixinho, um salão de bilhar no centro, na Rua dos Carijós. Ambos são jogadores medíocres, verdadeiros “pernas de pau” do taco. Concordam que o “feijão” — sorte, na gíria da sinuca — é o ingrediente mais importante do jogo.
Marco consegue arremessar uma bola azul para fora da mesa, os dois riem escancaradamente.
 — Chaplin ou Fellini? — ele pergunta enquanto pega a bola no chão.
— Hum...complicado...Fellini foi foda, grande, mas o Chaplin é gênio, quase inigualável — fala Geleia fisgando com um palito um ovo de codorna no prato.
Marco tenta repor a bola azul, a dois, no mesmo lugar que ela estava na mesa.
 — E o Pasqualle? Como é que foi? — pergunta Geleia.
— Ficou em cima do muro. Típico, né? Copiou a cena num pen drive, falou que vai mostrar pra uns amigos e depois dá a resposta — explica Marco, entre dois goles de cerveja.
— O cagaço dele é próprio de um cara que tem muito a perder. Não quer criar caso por causa de um filmezinho vagabundo... — analisa Geleia antes de se debruçar na mesa para dar a sua tacada.
— Tem a vaidade. O sujeito é o maior narciso. Vi que ele quase gozou se vendo na tela. Na verdade a atuação dele foi demais — considera Marco. — Deve ter participado do teatro na escola, há quinhentos anos atrás, e agora conseguiu fazer  um “ministro” no capricho.
— Também tem a maior pinta de canalha, não tem que fazer muita força pra atuar.
Geleia conseguiu “suicidar”. Acertou a bola branca na caçapa.
— Acho que nos finalmente ele vai acabar topando a parada. Vai sacar que o filme é uma gota d’água no oceano, nada que possa comprometer sua imagem. Quase que... uma brincadeira de amador — fala Marco, enquanto apalpa a barriga pensando nos quilos a mais que tem que perder.
— Glauber ou Godard? —pergunta Geleia, abastecendo de cerveja os dois copos.
— Extremos muito opostos. Glauber é tropicalista, cangaceiro das telas. Godard é música contemporânea, com pitadas de surrealismo — analisa Marco pegando o seu copo; antes de beber, pergunta:
— Então, suco de uva ou de abacaxi?
— Haxixe ou daime?
— Chinesa ou africana? — Marco, rindo.
Geleia pega um ovo de codorna. Enxuga-o com um guardanapo de papel. Joga para cima e consegue apará-lo com a boca. Mastiga.
— Olha só, desculpa, hem, mas pensando bem, o Godard e o Glauber têm em comum uma boa dose de chatice. Sei de gente que ia ficar puto de ouvir isso, mas os dois têm uns filmes difíceis de descer.
Marco finge que vai jogar um ovo de codorna em Geleia. Acaba colocando-o na própria boca.
— É, mas têm também obras primas. Gosto muito do Week End do Godard.
Geleia acerta uma tacada e consegue encaçapar duas bolas, a sete e a nove. Os dois gritam ao mesmo tempo:
— Feijão!
                                                                                       Fim do Episódio 5


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